Lava Jato apura se marqueteiro do PT recebeu parte dos R$ 12 milhões ’emprestados’ por Bumlai
06/04/2016, 05h00
João Santana, preso desde março, comandou campanha do prefeito de Campinas Dr. Hélio (PDT), em 2004, que teria recebido parte do dinheiro emprestados no Banco Schahin fraudulentamente por pecuarista amigo de Lula; citados por delatores pagaram empresa de publicitário
A força-tarefa da Operação Lava Jato investiga se o marqueteiro do PT João Santana recebeu parte dos R$ 12 milhões emprestados no Banco Schahin de forma fraudulenta pelo pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula, a pedido do PT. O publicitário – preso desde 23 de março, em Curitiba – foi o responsável pela campanha do ex-prefeito de Campinas (SP) Hélio de Oliveira Santos (PDT), o Dr. Hélio, em 2004, apontada em depoimentos como beneficiária dos recursos
Por meio de um empréstimo simulado, em 2004, compras fictícios de sêmens de gado de elite, contratos de mútuos e o direcionamento de um contrato de US$ 1,6 milhão da Petrobrás, o PT teria operacionalizado o desvio de R$ 12 milhões dos cofres públicos. Bumlai foi o tomador do empréstimo, que repassou a totalidade para contas do Grupo Bertin, para depois ser distribuído em duas frentes. Uma delas leva o dinheiro até Ronan Maria Pinto e a compra do Diário do Grande ABC – alvo da última fase da Lava Jato batizada de Carbono 14.
A outra, que chega até o marqueteiro do PT, leva aos empresários Armando Peralta e Giovani Favieri. Preso desde novembro de 2015, alvo da 21ª fase batizada de Passe Livre – referência ao acesso que tinha ao Planalto no governo Lula – Bumlai apontou os nomes dos dois empresários e do então presidente do Banco Schahin como propositores da operação. O verdadeiro beneficiário do negócio o PT, por meio do ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira, o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares e o ex-ministro José Dirceu. Os três negam envolvimento.
Em 2004, os dois trabalhavam na campanha do prefeito de Campinas e repassaram R$ 600 mil para a Santana e Associados Marketing e Propaganda, empresa do marqueteiro do PT. “Primeiro os que mais precisam” foi o slogan criado por João Santana para trabalhar a imagem popular de Dr. Hélio na disputa.
Apesar de ser do PDT, o prefeito teve sua candidatura bancada pelo PT nacional, com atuação direta de Dirceu. Os investigadores da Lava Jato querem saber qual a relação entre os R$ 12 milhões – nunca pagos formalmente ao Banco Schahin – e o repasse para João Santana.
A pagadora foi a Núcleo de Desenvolvimento Estratégico da Comunicação (NDEC), nome oficial da produtora VBC, que pertence a Armando Peralta e Giovane Favieri.
Ao mandar prender Ronan, a força-tarefa da Lava Jato cita os dois pagamentos. “A princípio, ele (Ronan) não era um marqueteiro de campanha que justificaria o repasse de valores para pagar dívidas de campanha, como seria o sr Armando Peralta e Giovani Favieri que, de acordo com o depoimento do sr José Carlos Bumlai receberam a outra metade dos R$ 12 milhões para pagar dívida de campanha do prefeito de Campinas, na época”, afirmou o procurador da República Diogo Castor de Mattos, nos autos da Carbono 14.
Segundo ele, a Procuradoria tem uma investigação em aberto sobre a lavagem na destinação da outra metade dos R$ 12 milhões emprestados por Bumlai. “Estamos investigando ainda essa remessa da outra parte do dinheiro”, disse o procurador.
“Em outubro de 2004, em São Paulo, no período da noite, (Bumlai) recebeu um telefonema de Sandro Tordin, Armando Peralta Barbosa e Giovane Faviere, não se recordando, com precisão, qual teria sido o interlocutor, uma vez que todos estavam juntos, e solicitaram que o interrogando comparecesse naquela mesma noite à sede do Banco Schahin”, registrou a Polícia Federal, em depoimento de Bumlai no dia 14, em Curitiba.
Tordin, citado por Bumlai, era o presidente do Banco Schahin, que fez delação premiada com a força-tarefa da Lava Jato e confessou a falsa operação de empréstimo ao PT. “Ambos (Peralta e Favieri) esclareceram que precisavam de recursos, por estavam realizando, à época, serviços para campanhas e estavam entrando em segundo turno”, esclareceu Bumlai à PF. “Acredita que o valor se destinava a quitar dívidas de campanha em Campinas.”
Investigados. Os nomes dos donos da NDEC e suas relações com João Santana estão desde 2006 no radar do Ministério Público Federal. A empresa pagou R$ 600 mil para a produtora Santana & Associados nas eleições municipais de 2004 – segundo revelou, em 2008, o Estadão. Foram dois repasses de R$ 300 mil por serviços prestados na campanha de Dr Hélio. Os pagamentos ocorreram entre setembro e outubro de 2004 – quando o publicitário ainda não havia assumido as campanhas presidenciais petistas, cargo que era ocupado por Duda Mendonça.
Naquele ano, Santana fez duas outras campanhas no pacote pago pelo PT. A do candidato a prefeito de Ribeirão Preto (SP) Gilberto Magionni e a do candidato a prefeito de Campo Grande (MS) Vander Loubet – ambos petistas.
A operação financeira, considerada “movimentação suspeita” pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), incluía ainda pagamento de R$ 950 mil pelo partido para Santana. No comunicado feito ao MPF, o órgão relatou que a empresa de Peralta e Favieri – a NDEC – movimentou R$ 4,5 milhões em 2004, valor “incompatível com sua capacidade econômico-financeira declarada em cadastro”. Do montante movimentado, 77% foram sacados na boca do caixa durante a eleição.
Petrobrás. Em depoimento nesta segunda-feira, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares confirmou à PF que os R$ 12 milhões teriam relação com campanha em Campinas (SP), em 2004.
Se comprovado o caminho do dinheiro até Santana, a Lava Jato vai apontar que dinheiro desviado da Petrobrás abasteceu campanhas eleitorais municipais, em 2004, via PT. Os procuradores da força-tarefa têm imputado crime de lavagem de dinheiro na ocultação de propina em repasses a partidos, campanhas e prestadores de serviços.
Mato Grosso. Peralta e Favieri são ligados ao ex-governador José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT, de Mato Grosso do Sul. Foi o ex-governador petista quem apresentou Bumlai a Lula. Foi ele também que aproximou o ex-prefeito de Campinas, nascido em Mato Grosso do Sul, do ex-presidente.
Bumlai falou à PF que já conhecia Peralta e Favieri de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul – onde os dois trabalharam para o ex-governador Zéca do PT. “Armando e Giovane prestavam serviços para campanhas eleitorais”, afirmou Bumlai. “Prestavam serviços para muitos partidos, dentre eles o PT, PMDB e PDT, por exemplo.”
Os nomes de Bumlai, Peralta e Favieri chegaram a ser citados no Caso Sanasa – maior escândalo de corrupção de Campinas, que levou o então prefeito Dr Hélio à cassação, em 2011, e sua mulher, Rosely Santos, a ser condenada por liderar um grupo que fraudava contratos da empresa de água da cidade em troca de propinas.
Defesa. Procurada pelo Estadão, a assessoria de imprensa do marqueteiro do PT informou que não iria se pronunciar. Em outra ocasião, sua defesa informou que os recebimentos da NDEC e do PT em 2004 foram legais.
Peralta e Favieri foram procurados, mas não foram localizados pela reportagem. O ex-prefeito de Campinas não foi localizado para comentar o assunto.
Peralta e Favieri foram procurados, mas não foram localizados pela reportagem. O ex-prefeito de Campinas não foi localizado para comentar o assunto.
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