Governo deve agir rápido para evitar novo rebaixamento, dizem economistas | VEJA.com
Agência de risco Standard & Poor's retirou o grau de investimento o país na última quarta-feira(Stan Honda/AFP/VEJA)
O rebaixamento da nota de crédito pela agência de risco Standard & Poor's (S&P) atiçou um senso de urgência na área econômica. Não importa a corrente de pensamento, existe um consenso entre os economistas de que a situação das finanças do país chegou a um ponto crítico. Mais do que tomar medidas para reverter o rebaixamento já feito pela S&P, a prioridade agora é evitar que Moody's e Fitch, as duas outras agências de referência global, tabém retirem o grau de investimento do Brasil.
"Foi inadmissível mandar para o Congresso o Orçamento do ano que vem com um rombo e agora o governo deve deixar claro que está comprometido com o cumprimento da meta de superávit primário do próximo ano, fixada em 0,7%. Vai doer, mas não tem jeito", diz o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. Para o mercado, é essencial que os ministros Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento, mostrem sintonia.
Numa outra frente, entende-se que é preciso iniciar um ajuste fiscal estrutural, de longo prazo. "O governo precisa reorganizar a base política e votar uma série de reformas que influenciariam o cenário das contas públicas no longo prazo", diz o economista Mansueto Almeida, especialista em contas públicas.
Na avaliação dele, a lista incluiria promover uma nova rodada da reforma da Previdência para rever a idade de aposentadoria discutir e redefinir o piso de programas de assistência. "Não é justo que o piso da Previdência, de quem sempre contribuiu com o sistema, seja igual ao piso da assistência social", diz Almeida. Ele também defende o fim das chamadas vinculações (verbas carimbadas) para áreas como saúde e educação, ou ao menos a revisão das regras. "A vinculação é feita em relação ao ano anterior: em anos que há um grande crescimento da receita, seguida de queda, isso cria problemas."
Economistas alinhados com o governo estão entre os mais serenos com a perda do grau de investimento. "A definição de uma agência de risco não é o fim do mundo", diz Márcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, que ajuda a produzir programas do governo. Mas até Pochmann concorda que o quadro exige atenção, ainda que seja por outras razões. Ele faz parte do grupo que defende um ajuste fiscal mais brando e longo, e que prioriza medidas de incentivo ao crescimento. "Não se faz ajuste com recessão e preso a medidas de curto prazo. Precisamos de um programa de ajuste com um horizonte de quatro anos que não penalize os investimentos."
Presidente - Na tentativa de acalmar o mercado, a
presidente Dilma Rousseff se reuniu neste sábado com os seus ministros para fazer um "pente fino" no que pode ser cortado nas pastas. Segundo fontes próximas ao governo, o plano inicial é economizar cerca de 15 bilhões de reais com o corte de cargos comissionados, reavaliação de investimentos e redução de contratos de serviços já firmados. O objetivo é justamente correr para tranquilizar o mercado e evitar o rebaixamento da nota brasileira pelas outras duas agências.
O que o Planalto quer mostrar é que está disposto a anunciar medidas o mais rápido possível. Por isso, ao contrário do que se esperava, conforme as decisões forem sendo avalizadas pela presidente, elas já serão comunicadas. As primeiras medidas devem ser anunciadas nesta semana. Inicialmente, a expectativa era de que o governo divulgasse um "pacotão" com seus projetos, o que poderia demandar um tempo maior. Para reforçar a arrecadação de 2016, além de um aumento na Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre combustíveis, o Executivo está discutindo até o encaminhamento de medida provisória que autoriza a União a vender imóveis de sua propriedade, incluindo terrenos da Marinha.
Vertentes - Uma preocupação das agências é o crescimento da dívida bruta - e aí chama a atenção a projeção da S&P. A agência estima que ela chegará a 72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2017. "É muito acima da média do mercado, que prevê, pela nossa análise, 68,5% do PIB em 2017. Assim, para segurar o grau de investimento, a meta do governo é não deixar que a dívida se aproxime de 70% do PIB", diz Bráulio Borges, economista da consultoria LCA.
Por causa dessa perspectiva, um grupo retomou uma discussão polêmica: a adoção de um ajuste mais amplo, que recaia sobre o chamado resultado nominal das contas públicas. O resultado primário (o foco das discussões no momento) é a diferença entre receitas e despesas do governo, sem itens financeiros. O resultado nominal, por outro lado, é mais amplo: inclui receitas totais (inclusive com aplicações financeiras) e as despesas totais (incluindo juros).
Em julho, no dado mais recente disponível, o governo acumulava, em 12 meses, um déficit primário de 51 bilhões de reais, ou 0,89% do Produto Interno Bruto (PIB). O resultado nominal, por sua vez, também acumulado em 12 meses, é um déficit de 502 bilhões de eais, o equivalente 8,8% do PIB. "Quando a gente discute metas de superávit primário, falamos de 10% do problema", diz Amir Khair, especialista em contas públicas e ex-secretário de Finanças na gestão da então petista Luiza Erundina, na Prefeitura de São Paulo.
Felipe Salto, assessor econômico do senador José Serra, do PSDB, concorda com o enfoque. "O governo pode, com um enorme esforço, reduzir o déficit primário ou alcançar um pequeno superávit, mas o déficit nominal continua alto." Para muitos, porém, não dá para discutir temas ligados a juros justo agora, quando a inflação beira os dois dígitos - e o juro alto é o remédio amargo para detê-la.
Seja qual for a proposta adotada, os economistas lembram que não se pode bobear com as agências. Elas até erram, mas são o farol para os investidores. Outro rebaixamento teria consequências nefastas para a recessão em curso. Encareceria ainda mais o crédito, no exterior, para empresas e bancos, elevando o custo do dinheiro para todos os brasileiros. Pressionaria o dólar e, por tabela, a inflação. Também faria do país terra proibida para bilionários fundos de investimento de primeira linha, que pelas próprias regras, não podem alocar recursos em países especulativos, o que escassearia o investimento estrangeiro.