Saiba como foi feita a série de reportagens investigativas Paradise Papers
- Apuração teve acesso a 13,4 milhões de arquivos
- 382 jornalistas de 67 países analisaram dados
- ICIJ coordenou a apuração com 96 veículos
- ‘Poder360’ investigou os casos brasileiros
Material está sendo analisado e investigado há cerca de 1 ano
O Poder360 iniciou neste domingo (5.nov.2017) a publicação da série Paradise Papers. A apuração baseia-se em 1 acervo de cerca de 13,4 milhões de arquivos de 2 escritórios especializados em abrir offshores, Appleby e Asiaciti Trust, e em bancos de dados de 19 paraísos fiscais.
Paraíso fiscal é como se convencionou classificar países nos quais cobra-se pouco ou nenhum imposto. Os que estão incluídos nesta reportagem são os seguintes: Antígua & Barbuda, Aruba, Bahamas, Barbados, Bermuda, Ilhas Cayman, Ilhas Cooks, Dominica, Granada, Labuan, Líbano, Malta, Ilhas Marshall, São Cristóvão e Névis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Samoa, Trindade e Tobago e Vanuatu.
Os dados totalizam 1,4 TeraByte. Foram obtidos pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung e compartilhados com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês).
Participaram da reportagem 382 jornalistas de 67 países. Esses profissionais atuam em 96 veículos de mídia diferentes. O material está sendo analisado e investigado há cerca de 1 ano para a preparação da série.
Durante o processo de apuração, os jornalistas em cada país cruzaram os dados obtidos com as pessoas e empresas citadas. Procuraram descobrir mais detalhes localmente sobre as informações contidas nos registros dos paraísos fiscais. Por fim, todas as partes citadas foram extensivamente ouvidas.
Manter uma empresa offshore é legal em muitos países, desde que o empreendimento pague impostos e seja declarado às autoridades. O conceito desta reportagem é que essas informações, mesmo quando não há ilegalidade evidente, devem ser divulgadas se houver interesse público e relevância jornalística –binômio que está presente num fato em que as personagens citadas ocupam cargos públicos ou têm papel de relevo na sociedade.
A apuração adotou rigor jornalístico para não imputar crimes a quem tem uma offshore devidamente declarada. Mas houve também a preocupação de divulgar os detalhes, muitas vezes inéditos, porque a pessoa citada desempenha papel de relevância na sociedade.
O ICIJ e o Poder360 prepararam 1 infográfico sobre a investigação:
Foram identificadas pelos Paradise Papers 24.996 pessoas jurídicas, entre empresas, trusts e fundações. 1 levantamento do ICIJ na base de dados da Appleby identificou cerca de 617 beneficiários de offshores com endereços no Brasil, o que deixa o país na posição 26 entre os mais citados.
Os Estados Unidos lideram a estatística, com 31.180 nomes ou endereços na base de dados do escritório. Em seguida estão o Reino Unido (14.434) e as Ilhas Bermudas (12.017).
Eis a lista dos 30 países com mais beneficiários em offshores do Paradise Papers:
Em números absolutos, o número de brasileiros citados na base de dados do Paradise Papers é menor se comparado com outras investigações coordenadas pelo ICIJ. Eis uma comparação:
INVESTIGAÇÃO NO BRASIL
No Brasil, o Poder360 colocou 1 time de 5 jornalistas para analisar os dados e investigar eventuais desdobramentos.O Poder360 preparou uma lista com os nomes de 78 mil pessoas conhecidas no mercado financeiro como “PEPs”, isto é, pessoas politicamente expostas, na sigla em inglês. Esses 78 mil nomes foram cruzados com os dados dos Paradise Papers.
Foram checadas, por exemplo, as 551 pessoas que exerceram o cargo de deputado federal em algum momento desde fevereiro de 2015 e 248 senadores e suplentes da atual legislatura e 1.061 deputados estaduais eleitos em 2014.
Foram analisados os nomes do atual presidente da República e os de todos os seus antecessores vivos.
Do Poder Judiciário, o Poder360 cruzou os nomes dos ministros atuais e dos ex-ministros vivos do STF e os de todos os tribunais superiores.
Todos governadores e vices foram confrontados com os arquivos da Appleby e da Asiaciti Trust.
Servidores públicos também foram escrutinados. A varredura passou por 8.970 funcionários da Câmara e do Senado e os 60.000 servidores mais bem remunerados do Poder Executivo.
A pesquisa ainda abrangeu envolvidos nas operações Lava Jato e Zelotes, no escândalo do mensalão e no FriboiGate, além dos nomes de 156 pessoas no alto escalão da Polícia Federal, entre vários grupos. Muitos outros cruzamentos foram realizados. Foram considerados para publicação os resultados que apresentaram relevância jornalística e interesse público.
Uma vez encontrado nome de algum brasileiro considerado pessoa politicamente exposta, o Poder360 verificava em todos os arquivos abertos e legais as atividades desse indivíduo. Foram realizadas centenas de contatos e entrevistas para tentar entender a natureza da offshore ou atividade no exterior que aparecia na base de dados dos Paradise Papers.
Há pouco mais de 1 mês, todos os veículos de comunicação envolvidos na investigação coordenada pelo ICIJ começaram, ao mesmo tempo, a contatar as pessoas citadas.
A política do Poder360 nesta investigação foi a de publicar as informações de todas as pessoas politicamente expostas no Brasil, mesmo que os titulares das empresas no exterior comprovassem ter declarado seus negócios à Receita Federal. A divulgação, entretanto, tomou o cuidado de deixar explícito quais foram os casos em que não há óbices legais.
O ICIJ entende que o acesso a empreendimentos no exterior é 1 privilégio de poucas pessoas. Em geral, a razão para ter uma empresa ou 1 trust num paraíso fiscal é pagar menos impostos, algo quase nunca acessível a todos os cidadãos de 1 determinado país. Daí a relevância jornalística e o interesse público na divulgação dos dados –sem com isso permitir a inferência de que todas as operações sejam ou contenham algo de ilegal.
ICIJ E OUTROS PAÍSES
Nos outros países, os parceiros do ICIJ na série Paradise Papers também fizeram checagens semelhantes ao processo adotado pelo time de jornalistas do Brasil.Esse tipo de iniciativa tem se tornado cada vez mais comum sob a liderança do ICIJ. O consórcio é uma ONG criada há 20 anos. Sua sede é em Washington, capital dos Estados Unidos. A ideia principal é que no século 21 as grandes reportagens serão cada vez mais multinacionais –e é financeiramente inviável que apenas 1 veículo de comunicação possa fazer sozinho uma apuração dessa envergadura.
Os cerca de 13,4 milhões de documentos da série Paradise Papers jamais seriam analisados de forma extensiva se tivessem ficado circunscritos a apenas 1 veículo jornalístico em 1 determinado país. Por essa razão, o “Süddeutsche Zeitung”, 1 parceiro tradicional do ICIJ, procurou o consórcio ao obter o vasto acervo de dados. Uma força-tarefa jornalística mundial então foi criada.
O consórcio funciona como coordenador e facilitador das reportagens. Os jornalistas se comunicam apenas por meio de 1 sistema criptografado. Houve uma reunião presencial, secreta, na Alemanha. Dezenas de jornalistas foram até Munique e trocaram informações nos dias 27 e 28 de março de 2017. O Poder360, único veículo brasileiro nesta investigação, esteve presente. Apesar de mais de 3 centenas de profissionais estarem envolvidos no processo, nada vazou durante o período de apuração.
O banco de dados dos documentos analisados passou por uma extensa triagem e tabulação. Tudo foi mantido em total reserva até a data e horário de publicação –acordada entre todos os parceiros da empreitada. Para os Paradise Papers, a divulgação está sendo em todos os países neste domingo (5.nov.2017), às 16h (horário de Brasília).
O ICIJ tem critérios próprios para escolher e convidar os seus jornalistas associados. Há no momento cerca de 200 repórteres em 70 países no consórcio. A participação dos profissionais é apenas por meio de convite. Não há remuneração. Trata-se apenas de compartilhar esforços em investigações internacionais.
Em geral, os associados do ICIJ quase sempre são convidados a participar de projetos de abrangência global. Veículos que não têm membros efetivos no consórcio também podem receber convites eventualmente. No caso do Poder360, o jornalista Fernando Rodrigues é 1 dos cerca de 200 repórteres associados ao ICIJ desde o ano 2000.
Participaram da apuração da série Paradise Papers no Brasil os repórteres Fernando Rodrigues, Mateus Netzel, Douglas Pereira, Ana Krüger e Luiz Felipe Barbiéri.
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