Por que o presidente da CBF tem que se preocupar com a investigação do FBI
Presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) até abril de 2015, José Maria Marin foi um dos sete dirigentes do futebol internacional detidos na manhã de quarta-feira (27), em Zurique (Suíça), numa ação liderada pelo FBI (polícia federal americana). Contudo, ele não é o único cartola brasileiro implicado nas investigações sobre corrupção no esporte.
Marco Polo Del Nero, sucessor e atual mandatário da entidade que comanda o futebol nacional, aparentemente é um dos suspeitos listados nos documentos montados pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos. E isso pode ter efeitos práticos no futuro do esporte nacional.
Del Nero assumiu a presidência da FPF (Federação Paulista de Futebol) em 2003 e teve trajetória ascendente desde então. Membro do comitê executivo da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol), ele foi indicado por Ricardo Teixeira, então mandatário da CBF, e passou a integrar o comitê executivo da Fifa em 2012.
O dirigente não chega a ser citado nominalmente em nenhum documento da investigação divulgado Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Em dois arquivos, porém, um dos suspeitos é descrito como membro do alto escalão da Fifa, da Conmebol e da CBF, credenciais que batem com as de Del Nero. As ações desse personagem reforçam indícios de participação do atual chefe do futebol nacional no esquema de corrupção.
Segundo a investigação, duas empresas de marketing esportivo fecharam contratos para compra dos direitos comerciais da Copa do Brasil após negociar pagamentos de R$ 2 milhões anuais de propina a um membro da CBF. Esse conspirador, que seria Ricardo Teixeira, teria lucrado ilegalmente com negociações de contratos da entidade durante a década de 90.
Em 2012, antes de o acordo ser consumado, José Maria Marin (citado nominalmente) e outro suspeito ascenderam ao poder da CBF e também teriam exigido pagamentos ilegais. Isso teria aumentado o valor da propina.
Numa conversa interceptada pela investigação, José Maria Marin chegou a negociar com José Hawilla o pagamento de propina a ele e outro membro da CBF, que seria Del Nero. Questionado se seu antecessor Ricardo Teixeira deveria seguir recebendo pagamentos ilegais, o então mandatário respondeu: "Chegou a hora de vir para nós".
Del Nero também supostamente aparece em denúncia sobre a Copa América. Ele está em lista de personagens que teriam recebido propinas referentes a um contrato com a Datisa, empresa formada em 2013 com participação da Traffic. A companhia desembolsou US$ 317,5 milhões pelos direitos comerciais das edições 2015, 2019 e 2023, além da Copa América Centenário de 2016 (US$ 75 milhões, US$ 80 milhões, US$ 85 milhões e US$ 77,5 milhões, respectivamente). O suspeito recebeu U$ 500 mil, assim como outros dez oficiais da Conmebol.
Del Nero minimiza
Até o momento, a única manifestação de Del Nero sobre o caso aconteceu em entrevista coletiva a jornalistas que estavam em Zurique na terça-feira. O dirigente brasileiro classificou o escândalo como péssimo, mas contemporizou: "Precisamos analisar tudo e saber o que aconteceu". Depois, afirmou que as suspeitas precedem o início da administração de José Maria Marin na CBF, em 2012. "Não há nenhum contrato pós", disse o atual presidente, desmentido pelas datas contidas nos documentos.
No Brasil, a CBF fez grande esforço para que as denúncias não pespegassem em Del Nero. A entidade emitiu nota na terça-feira dizendo que "aguarda, de forma responsável, a conclusão das investigações, sem qualquer julgamento que previamente condene ou inocente". O texto ainda afirma que "a nova gestão da CBF, iniciada no dia 16 de abril de 2015, reafirma seu compromisso com a verdade e a transparência".
Em contato com o UOL Esporte, o secretário-geral da CBF, Walter Feldman, relatou conversa com Del Nero e disse que o presidente não manifestou preocupação sobre o caso. O atual mandatário também negou participação em contratos e em qualquer decisão da gestão de Marin.
Fifa preocupada
No entanto, existe uma preocupação na Fifa sobre a participação de Del Nero. A entidade ainda tenta entender qual foi o real papel de alguns dirigentes no esquema, e o brasileiro é parte desse processo.
Del Nero fez alterações contundentes no quadro de funcionários da CBF após ter assumido a presidência. Há suspeita na Fifa de que o brasileiro pode ter feito isso como forma de se proteger ou de diminuir danos.
A despeito de a investigação ter explodido na terça-feira, trata-se de um processo iniciado há pelo menos dois anos. O empresário J. Hawilla passou meses negociando delação à polícia dos Estados Unidos e prestou depoimento em dezembro de 2014. Portanto, ainda que as prisões tenham sido surpreendentes, dirigentes não foram exatamente surpreendidos e tiveram algum tempo para preparar terreno.
Mesmo com esse processo de blindagem, entretanto, a história debela o capital político de Del Nero. O dirigente já perdeu um de seus vices – Marin foi afastado até a conclusão do processo – e agora está em xeque: fragilizado, com enorme risco de uma investigação mais abrangente chegar a seu quintal.
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