ENTREVISTA - MÔNICA BAUMGARTEN DE BOLLE
Brasil deveria assumir vocação para agroindústria
PARA DIRETORA DO INSTITUTO DE ESTUDOS DE POLÍTICA ECONÔMICA/CASA DAS GARÇAS, PODE SER ENGANO COMPETIR EM TECNOLOGIA DE PONTACecilia Acioli/Folhapress | ||
A economista Mônica Baumgarten de Bolle |
DO RIO
O Brasil precisa decidir qual é a vocação de sua economia, diz a economista Mônica Baumgarten de Bolle, 40, diretora do Instituto de Estudos de Política Econômica/Casa das Garças, local que reúne economistas de pensamento liberal, muitos deles formados na PUC-RJ.
"Se for mais baseada em serviços, e não em indústria, isso não é necessariamente ruim", diz Mônica, também professora da PUC-RJ.
Mas o caminho, em sua opinião, está no setor agroindustrial. O mundo globalizado, explica ela, não permite que os países sejam competitivos em todas as áreas industriais. Por isso é preciso encontrar um setor e focá-lo.
Leia abaixo trechos da entrevista à Folha.
Leia abaixo trechos da entrevista à Folha.
Folha - Por que a economia está parada?
Mônica de Bolle - A indústria, que não vai bem há pelo menos dois anos, é em parte responsável. O segundo fator foi uma quebra de safra agrícola brutal. Isso e o baixo crescimento nos EUA, a recessão na Europa e a desaceleração na China explicam o PIB do primeiro semestre.
Mônica de Bolle - A indústria, que não vai bem há pelo menos dois anos, é em parte responsável. O segundo fator foi uma quebra de safra agrícola brutal. Isso e o baixo crescimento nos EUA, a recessão na Europa e a desaceleração na China explicam o PIB do primeiro semestre.
Como fazer para tirar a economia dessa situação?
Mais investimento. No início dos anos 2000, a taxa de investimento do Brasil era de 15% sobre o PIB. Hoje está em torno de 19%, muito aquém de países como Chile, que investe perto de 28%, e México, 25%. Numa conta rápida, precisamos investir ao menos 8% a mais por ano para chegar a taxas comparáveis a essas nos próximos cinco anos.
Mais investimento. No início dos anos 2000, a taxa de investimento do Brasil era de 15% sobre o PIB. Hoje está em torno de 19%, muito aquém de países como Chile, que investe perto de 28%, e México, 25%. Numa conta rápida, precisamos investir ao menos 8% a mais por ano para chegar a taxas comparáveis a essas nos próximos cinco anos.
O que a sra. achou do pacote de concessões em infraestrutura lançado pela presidente Dilma Rousseff?
O anúncio carrega sinalizações importantes, como o reconhecimento de que existe um problema grave de infraestrutura no país. O mais importante é a mudança de posição do governo em relação à participação do setor privado nos grandes projetos. Mas nada disso vai ter um efeito de curto prazo.
O anúncio carrega sinalizações importantes, como o reconhecimento de que existe um problema grave de infraestrutura no país. O mais importante é a mudança de posição do governo em relação à participação do setor privado nos grandes projetos. Mas nada disso vai ter um efeito de curto prazo.
A sra. concorda que a política de crescimento econômico com base no incentivo ao consumo está se esgotando?
Não gosto desse bordão e não acho que seja verdade. Houve incentivo ao consumo, sim, e muito. Mas o crescimento de 2004 a 2010 veio também do investimento e do gasto público. Agora as famílias estão amortizando suas dívidas em um cenário de queda de juros e de pleno emprego. São condições ótimas para a volta do consumo.
Não gosto desse bordão e não acho que seja verdade. Houve incentivo ao consumo, sim, e muito. Mas o crescimento de 2004 a 2010 veio também do investimento e do gasto público. Agora as famílias estão amortizando suas dívidas em um cenário de queda de juros e de pleno emprego. São condições ótimas para a volta do consumo.
Como temos pleno emprego no Brasil se a indústria vai mal e economia anda de lado?
O perfil da economia brasileira mudou. O setor de serviços, intensivo em mão de obra, ganhou espaço onde a indústria perdeu.
O perfil da economia brasileira mudou. O setor de serviços, intensivo em mão de obra, ganhou espaço onde a indústria perdeu.
Quais os riscos de uma economia mais baseada em serviços do que em indústria?
Não existe na literatura acadêmica evidência de que a indústria seja superior a serviços em investimento, tecnologia e produtividade.
Não dá para comparar cabeleireiro com fabricante de equipamentos para poços de petróleo. Mas o setor de serviços não é só isso. Pode incluir pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de ponta.
Não existe na literatura acadêmica evidência de que a indústria seja superior a serviços em investimento, tecnologia e produtividade.
Não dá para comparar cabeleireiro com fabricante de equipamentos para poços de petróleo. Mas o setor de serviços não é só isso. Pode incluir pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de ponta.
Qual o papel da indústria na reativação da economia?
Pelo visto o país quer um setor industrial grande. Há basicamente dois modelos. Os EUA têm o que eu chamo de indústria hipermercado. Produzem de tudo, de sapato a equipamentos médicos de alta tecnologia. Já alemães e coreanos focam em engenharia e tecnologia de ponta.
São modelos, e precisamos encontrar o nosso. Com o grau de globalização do mundo, não é razoável acharmos que vamos produzir o que quer quer seja como a China, que tem mão de obra mais barata.
Pelo visto o país quer um setor industrial grande. Há basicamente dois modelos. Os EUA têm o que eu chamo de indústria hipermercado. Produzem de tudo, de sapato a equipamentos médicos de alta tecnologia. Já alemães e coreanos focam em engenharia e tecnologia de ponta.
São modelos, e precisamos encontrar o nosso. Com o grau de globalização do mundo, não é razoável acharmos que vamos produzir o que quer quer seja como a China, que tem mão de obra mais barata.
Qual seria nossa vocação?
Um setor que é fantástico e altamente competitivo, e que as pessoas não enxergam como indústria, é o agroindustrial. Com essa infraestrutura em frangalhos que temos, como um produtor lá no interior do Brasil consegue escoar sua produção para o porto e vender no exterior a um preço competitivo?
Um setor que é fantástico e altamente competitivo, e que as pessoas não enxergam como indústria, é o agroindustrial. Com essa infraestrutura em frangalhos que temos, como um produtor lá no interior do Brasil consegue escoar sua produção para o porto e vender no exterior a um preço competitivo?
Qual sua expectativa para o PIB em 2012?
Acho que em 2013 chegamos perto de 4%. Neste ano, está praticamente impossível crescer mais de 2%.
Acho que em 2013 chegamos perto de 4%. Neste ano, está praticamente impossível crescer mais de 2%.
Qual comparação a sra. faz entre as políticas econômicas de Dilma, Lula e FHC?
Comparar com FHC é muito difícil, porque são momentos absolutamente distintos da economia brasileira. O governo FHC estava construindo a estabilidade macroeconômica e esse foi seu grande legado. O país não tinha credibilidade nenhuma no exterior. Ele plantou as sementes que Lula colheu mais tarde.
Comparar com FHC é muito difícil, porque são momentos absolutamente distintos da economia brasileira. O governo FHC estava construindo a estabilidade macroeconômica e esse foi seu grande legado. O país não tinha credibilidade nenhuma no exterior. Ele plantou as sementes que Lula colheu mais tarde.
E entre Dilma e Lula?
Em termos de cenário externo, Lula surfou uma onda inacreditável, mesmo com a crise de 2008. A Dilma pega um cenário externo mais hostil. Por outro lado, ela tem um projeto para o país, mesmo que não saibamos muito bem o que é. O Lula tinha um projeto de permanência no poder. Ela tem visões maiores. Se concordamos ou não, é outra história.
O que eu acho ruim na Dilma é o seu viés intervencionista. As medidas de proteção à indústria e de conteúdo local não vão fazer bem para o país. Mas até seu intervencionismo é pragmático. O plano de concessões mostrou isso.
Ela parece querer mostrar que não tem medo de mexer nesses ninhos de vespa.
Em termos de cenário externo, Lula surfou uma onda inacreditável, mesmo com a crise de 2008. A Dilma pega um cenário externo mais hostil. Por outro lado, ela tem um projeto para o país, mesmo que não saibamos muito bem o que é. O Lula tinha um projeto de permanência no poder. Ela tem visões maiores. Se concordamos ou não, é outra história.
O que eu acho ruim na Dilma é o seu viés intervencionista. As medidas de proteção à indústria e de conteúdo local não vão fazer bem para o país. Mas até seu intervencionismo é pragmático. O plano de concessões mostrou isso.
Ela parece querer mostrar que não tem medo de mexer nesses ninhos de vespa.
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